quarta-feira, 9 de agosto de 2017

A Morte-Vida


" Abril é o mais cruel dos meses "

                             T. S. Eliot, A Terra Desolada


        Em abril de 2005 tive uma experiencia de quase morte. Os remédios que usava para depressão, esquizofrenia e síndrome do pânico, me causaram uma hepatite medicamentosa. Quando meu psiquiatra soube, pelos exames de sangue, dessa lesão no meu fígado, decorrente do excesso de medicamentos, mandou-me parar de usá-los. A interrupção abrupta provocou o que os médicos chamam de efeito rebote, que foi o responsável pela minha quase morte. Passei cinco dias e noites em pânico, sem comer nem dormir. na quinta noite senti meu espírito abandonando meu corpo, como se estivesse morrendo. Por algum tempo, não me lembro quanto, vislumbrei outra dimensão extrafísica, que estava como que pintada de faixas e manchas azuis. Fiquei com a impressão de ter ido para o outro lado da vida e voltado. Ainda não era a hora de retornar para a pátria espiritual.
        Em um mês emagreci vinte quilos. Passei a vagar pelo mundo como um morto-vivo, uma alma penada expiando seus pecados, com um olhar que gritava e que assombrava as pessoas. Nos meses seguintes ficava meditando o porque de ter vivido todo aquele horror. Minha consciência católica procurava entender ou descobrir quais os pecados hediondos  havia cometido para merecer um castigo tão cruel.
        Desde aquele ano fatídico minha vida se tornou um vagar sem termo, um caminhar sem rumo nem objetivo, uma peregrinação furtiva em busca de algo que não sabia exatamente o que era, talvez uma escavação em busca de si mesmo; a demanda de um sentido individual e coletivo para a existência; uma revolução socialista; uma família com esposa e filhos; ou simplesmente tentar sobreviver nesses nosso tempos calamitosos.
        Foram doze anos vagando pelo Brasil como uma alma penada, como que para se redimir de alguma maldição, carregando nos ombros curvados o peso de uma culpa milenar. Fogo apartado, vivendo a margem da sociedade, sem emprego, sempre só, visto por muitos como um vagabundo, e por quase todos como um louco. Me agarrava aos estudos como um náufrago abraçado a uma tábua de salvação.
        Em 2009 fiz um voto de castidade como forma de penitência, depois de ter vivido outra experiência de horror em agosto de 2008, que quase me levou ao suicídio. Estou há oito anos casto e talvez graças a isso, por uma graça concedida por Deus, estou me libertando da minha morte-vida.

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